Atletas brasileiros rompem bolha bolsonarista no esporte e bombam nas redes

Atletas brasileiros rompem bolha bolsonarista no esporte e bombam nas redes

Jogadores da seleção de futebol, Richarlison e Paulinho assumem posição contra o ódio e o preconceito. A rainha Marta protesta contra a Nike e homenageia noiva, e Douglas Souza, do vôlei, quer Fora Bolsonaro

Um sopro de esperança contra o ódio, o preconceito e o bolsonarismo, que vinham até então dominando as várias categorias esportivas no país, começa a ser sentido com uma nova geração de atletas que têm levantado suas vozes em favor das minorias, dos mais pobres, dos direitos e da liberdade religiosa.

Paulinho e Richarlison e a atacante Marta, das seleções masculina e feminina de futebol; e o jogador Douglas Souza, do Vôlei, que disputam as Olimpíadas de Tóquio, no Japão, têm ganhado a cada dia mais seguidores em suas redes sociais, por seus posicionamentos contra as injustiças sociais.

Embora não tenha sido tão explícito em suas críticas, como fez a jogadora de vôlei de praia, Carol Solberg, punida com advertência pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), por ter gritado “Fora, Bolsonaro” durante entrevista após uma competição, o atacante Richarlison, de 23 anos, que joga no Everton, da Inglaterra, tem feito manifestações políticas tanto em suas redes, como em entrevistas.

“Quando tiver uma causa importante eu sempre vou botar a cara, ainda mais jogando na seleção e na Inglaterra. Eu tenho essa visibilidade e sei que as autoridades olharão com carinho”, afirmou, durante entrevista coletiva da seleção no início de novembro do ano passado.

Richarlison, que fez três dos quatro gols no jogo em que o Brasil venceu a Alemanha por 4 a 2, já se posicionou contra o racismo pelas mortes do menino João Pedro, assassinado com um tiro pela polícia no Rio; do norte-americano George Floyd, estrangulado até a morte por um policial branco nos Estados Unidos e pela morte brutal de João Alberto Silveira Freitas, por seguranças do Carrefour, em 20 de novembro passado, Dia da Consciência Negra. Seu posicionamento é oposto ao do atacante Neymar que nunca se manifestou contra as injustiças sociais, mesmo tendo sido alvo de preconceito racial.

Richarlison demonstrou, ainda, repúdio à absolvição do acusado de estupro da jovem influencer, Mariana Ferrer; fez críticas ao apagão no Amapá, que durou mais de 20 dias; à falta de oxigênio nos hospitais e postos de saúde do Amazonas, no auge da pandemia do coronavírus, e hoje é o embaixador da USP Vida, na luta contra a Covid-19.

“Okê Arô! Saravá meu Pai”
Com a frase “Okê Arô! Saravá meu Pai”, o atacante Paulinho, do Bayer Leverkusen, da Alemanha, usou as redes sociais para agradecer aos deuses do Candomblé, religião afro, o gol marcado contra a seleção alemã, no primeiro jogo do Brasil nas Olimpíadas de Tóquio.

Ele costuma comemorar seus gols com uma flecha, gesto que repetiu ao comemorar contra a Alemanha, numa exaltação ao orixá Oxóssi, que, segundo o Candomblé, foi o responsável por matar com uma flechada uma ave enviada por feiticeiras para trazer a fome e a miséria para o reino. Para ele, sua fé vai além da religião, é uma filosofia de vida, que toca o seu coração.

“Sou eu comigo mesmo, entende? Cultuar essa filosofia me traz muita energia boa, muito axé. Como assentado e praticante, vou ao meu pai de santo sempre que estou no Brasil e peço proteção aos orixás, principalmente ao meu Pai Oxóssi e à minha Mãe Iemanjá. Laroyé”, declarou e, prosseguiu : “Por tudo que nosso país já sofreu, temos não só o preconceito com religiões de matriz africana, mas também de outras naturezas, como de raça, gênero e orientação sexual. Como uma pessoa que tem voz, eu não posso me dar o direito de permanecer calado. De não me posicionar diante de preconceitos e negligências”.
Neymar precisa escutar esse jovem jogador. E o gigante Richarlison também.

Paulinho é mais explicito em suas críticas a Bolsonaro, especialmente contra a conduta do presidente no combate à pandemia e diz que reza todos os dias para que Exu ilumine o Brasil e os nossos caminhos.

“Que os orixás nos deem forças pra buscar essa medalha de ouro. O brilho dela seria um alento para o povo brasileiro após tantos meses de caos no país”, afirmou.
Paulinho afirmou ainda que se é crítico do atual governo, é porque confia na ciência. Numa carta publicada no “The Player’s Tribune”, o jogador de 21 anos, do Bayer Leverkusen, fez fortes críticas sobre as desigualdades sociais do país, as condutas do presidente Jair Bolsonaro, e destacou que o bicampeonato olímpico pode ser um alento para um país que lida com a pandemia de Covid-19.

“Todo mundo enxerga o que se passa durante esse um ano e meio de pandemia, todo o descaso com a saúde. Mesmo vivendo em outro continente, tenho pessoas queridas que moram no Brasil. Elas precisam de segurança, de amparo, de vacinas”, declarou.

As declarações de Paulinho e Richarlison foram apoiadas pelo ex-jogador do Corinthians e da seleção brasileira de futebol, Casagrande, que junto com Sócrates, foi um dos pioneiros da “Democracia Corintiana”, o maior movimento ideológico da história do futebol brasileiro, onde a liberdade para expressar opiniões políticas e outros, era decidida por meio do voto igualitário de todos os seus membros. Sócrates e Casagrande foram pioneiros em defender eleições diretas no país e se posicionar contra a ditadura militar.

Gays assumem protagonismo no esporte
O esporte historicamente sempre foi um setor avesso à comunidade homossexual. São inúmeras as histórias de homens e mulheres que temiam assumir a sua sexualidade. Mas isto vem mudando e atletas não temem mais falar abertamente sobre a suas opções sexuais.

A rainha do futebol Marta, é uma das atletas mais consagradas mundialmente que não teme se manifestar. Mesmo sem se posicionar politicamente com críticas ao governo Bolsonaro, a atacante da seleção brasileira de futebol feminino tem abertamente falado sobre o seu relacionamento com outra mulher.

No primeiro jogo da seleção, em que o Brasil venceu por 5 a zero a China, Marta comemorou um dos seus três gols fazendo um “T” com os braços em homenagem a Toni Pressley, jogadora norte-americana, sua noiva.

“Eu tentei fazer no primeiro gol, mas aí uma galera me abraçou e aí não deu jeito. Mas aí saiu mais um pra coroar e, graças a Deus, eu pude fazer essa homenagem pra ela”, disse a jogadora após o jogo.

As jogadoras têm apoiado causas sociais como campanhas contra o câncer de mama, doença que Pressley venceu há poucos anos, o veganismo e direitos dos animais.

Marta, defensora da igualdade no futebol feminino, cujas jogadoras ganham infinitamente menos que os homens, ao posar com a camisa da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), para uma foto oficial, deixou cair seus cabelos em cima do símbolo da Nike, empresa patrocinadora. Muitos consideraram um gesto silencioso de protesto.

No vôlei, em que alguns jogadores se posicionaram a favor de Bolsonaro nas eleições de 2018, como Maurício Souza e Wallace, que em foto tirada após um jogo do Mundial de 2018 sinalaram com o número 17 do então candidato à presidência pelo PSL, uma voz se levanta contra o atual governo.

É Douglas Souza, que tem recebido cada vez mais o carinho dos fãs brasileiros. Assumidamente gay, o ponteiro da seleção que está em Tóquio, tem nas redes se posicionado numa forma divertida e alegre.

Numa live com Maurício de Souza, criador da “Turma da Mônica” e apoiador de Bolsonaro, Douglas brincou dizendo que só o aceitaria como seguidor em sua rede social se Bolsonaro caísse.

Ele sabe que muita gente deixou de admirar a seleção brasileira de vôlei pelas atitudes conservadoras de outros jogadores e, que agora, parte dos fãs do esporte começam a voltar a admirar e respeitar o time.

Em entrevista ao UOL, Douglas disse que fica “muito, muito feliz que as pessoas agora estão conseguindo olhar pro nosso time de vôlei, do Brasil, com olhar diferente” e, complementa: “Para que elas torçam de alguma forma, que seja por mim e tal. Eu sinto sim que eu estou representando todo mundo. O vôlei é um esporte coletivo, se você quiser torcer pelo Douglas você precisa torcer pela seleção em si, pelo time todo, para todo mundo jogar bem. Acho que o vôlei é o esporte mais coletivo do mundo e eu fico feliz que as pessoas estão tendo essa oportunidade de olhar para a gente com outros olhos”.

Como declarou Casagrande: “ talvez esteja surgindo uma geração inteligente”.

Fonte: Cut

Redação